Meus pais moravam na marginal (A. Paulo dias de Novais) junto ao Instituto do Café, perto da Igreja da Nazaré
No dia 25, como de costume, depois de passar pelo armazém dos produtos farmacêuticos dos laboratórios representados pela Zuid, situado no fim da rampa do Liceu, reuni-me com colegas do mesmo ofício, num café situado no Bairro de S. Paulo.
Havia um nervosismo em quase todos eles;
Então já sabem do que se passou em Lisboa? – Dizia um;
Houve um golpe militar que derrubou o regime – Dizia outro;
Levei toda a noite a ouvir o rádio e os comunicados das forças armadas – Afirmava outro;
No café onde nos encontrávamos só se falava disto.
Todos pareciam contentes e esperançados de que a vida seria melhor daí para a frente.
Nessa época, em Angola, não havia televisão. As notícias chegavam pela rádio e pelos jornais. Lembro-me, contudo, de ter visto um fulano com um jornal e a imagem dum menino a pôr um cravo na espingarda dum soldado ou qualquer coisa parecida com isso (a esposa era hospedeira da TAP e tinha trazido o jornal).
Rememoro aquela manhã de 25 de Abril de 1974, em que nos locais de trabalho, nas ruas, nas lojas de comércio, nas esplanadas correu de boca em boca a notícia de uma revolução em Lisboa.
Foi a revolta dos capitães, - como diziam uns.
É o movimento do MFA – diziam outros.
A revolução dos cravos – como também lhe chamava.
A alegria parecia chegar a tudo e todos e logo se começou a pensar da possibilidade de independência. Todos afirmavam de como tudo iria ser melhor! Anteviam-se sonhos de liberdade e progresso. Uma nova era se vislumbrava no futuro. Gentes de todas as cores e raças pareciam que beber o ar da vitória. A Grande Angola iria ser ainda maior. Quanto não iria valer a moeda angolana! Até já se faziam previsões de câmbios.
Repórteres de jornais e revistas vieram para a rua fazer inquéritos.
Quem pretendia a independência? - Perguntavam.
Todos, era a resposta de brancos, negros ou mestiços.
Quem queria continuar, em Angola? – Todos, é claro.
Todos estavam empenhados no desenvolvimento dessa terra; os que lá nasceram e os que a tinham adoptado como sua. Apenas uma minoria de militares, alguns quadros e poucos mais tinham intenção de regressar à Metrópole. Na população em geral uma maior onda de fraternidade mais nos irmanava. A independência tornou-se o tema geral das conversas, falava-se dela apaixonadamente.
A grande Angola iria ser ainda maior depois que a guerra acabasse e a energia de todos fosse canalizada para o progresso daquela grande Terra.
Aqui e além porém encontrava-se alguém que fugia ao tema deixando intrigados os restantes.